16 Jan 2020

"Salvámos a rolha de cortiça"

Grupo Amorim celebra 150 anos e quer lançar as bases para mais 150.

Rolha que se enrosca da Corticeira vai ser arma contra o alumínio

A Corticeira Amorim acredita que a rolha vai ganhar quota ao plástico e ao alumínio. Esse será um dos eixos de crescimento do negócio, que faz 150 anos em 2020. Outro eixo será o das aquisições, "táticas, não big bangs", revela o CEO, António Rios Amorim.

No ano em que se celebram os 150 anos do Grupo Amorim, há uma história que a família reunida num evento realizado na primeira grande fábrica de produção de rolhas, em Santa Maria de Lamas, faz questão de lembrar e que serve de alerta para o futuro. Há cerca de 20 anos, com a invasão dos vedantes de borracha e plásticos, a Corticeira Amorim passou por um período muito difícil e esteve quase para desistir da rolha. Não o fez e hoje vende 5,5 mil milhões de rolhas por ano. Agora é o vedante de cortiça que ameaça roubar negócio aos outros.

"Queremos ganhar quota às rolhas de plástico e abreve trecho às cápsulas de alumínio", afirma António Rios Amorim, CEO da Corticeira Amorim, numa breve entrevista com o Negócios. "Vamos começar uma iniciativa contra as cápsulas de alumínio, com rolhas que possam dar a mesma conveniência de abertura". A empresa criou a rolha Helix, que se enrosca e não precisa de saca-ro- lhas. "Já estamos a entrar em alguns mercados", garante o responsável que salienta ainda que esta solução acrescenta um fator "premium" ao produto.

Este será um dos pilares de crescimento do negócio de rolhas, que representa 72% do volume de negócios da Corticeira Amorim. Uma percentagem que "pode aumentar alguma coisa no curto prazo, porque esta mudança do plástico para a cortiça pode acelerar nos próximos dois ou três anos, mas depois não teremos muito mais a conquistar aos vedantes alternativos". Os de plástico já baixaram de quatro para dois mil milhões de unidades por ano.

Outro fator que pode ajudar ao negócio será o desanuviamento das tensões comerciais. "Achamos que depois desta conjuntura menos positiva dos desacordos comerciais no mundo, o consumo de vinho vai voltar a crescer". Isso significa mais garrafas e mais rolhas. Além do vinho e espumantes, António Rios Amorim vê um grande potencial nos espirituosos.

Os materiais de construção, onde a empresa pretende entrar em novos mercados, e os materiais compósitos, para os quais vai explorar novas aplicações, completam os "três grandes pilares que vão suportar o crescimento da Corticeira Amorim", afirma o CEO.

Mais aquisições na calha

"Faz sentido complementar o crescimento orgânico, que pretendemos seja à volta dos 3%, com aquisições pontuais, seja através de jointventures', seja através de participações em empresas que possam acrescentar valor àquilo que fazemos hoje", afirma António Rios Amorim.

No ano que passou a Corticeira reforçou a sua participação na fabricante de rolhas francesa Bourrassé e adquiriu 50% da empresa checa de vedantes de vidro e cristal Vinolok "A estratégia de aquisições vai manter-se, com aquisições mais táticas do que Taig bangs'", esclarece.

O crescimento será suportado também pela abertura de novas unidades fabris. Está prevista a abertura em abril de uma fábrica de rolhas na Austrália, mercado onde a empresa duplicou as vendas nos últimos três anos, num investimento de 3,5 milhões de euros. E em 2020, a Corticeira Amorim vai mudar-se para uma fábrica de maior capacidade no Chile, numa parceria com o maior produtor de vinho do país.

Falta de matéria-prima

O crescimento do negócio vai exigir mais matéria-prima. António Rios Amorim assinalou na conferência de imprensa que "a densidade de montado em Portugal está a baixar" e "é preciso tratar do abastecimento da matéria-prima". O que passa por aumentar em sete vezes a densidade do sobreiro e optar pela rega gota a gota, que permite diminuir o ciclo de extração de 25 para 10 anos.

"Isto vai melhorar muito a rentabilidade dos produtores florestais" e permitirá atrair investidores financeiros, acredita o CEO da Corticeira. A empresa gostaria que se chegasse aos 50 mil hectares produzidos com este modelo que j á está a ser usado pela própria Corticeira numa plantação de 250 hectares em Alcácer do Sal.

Ao Negócios, António Rios Amorim defendeu que o sobreiro deveria ser incluído nos planos de defesa da floresta. "Para que não voltem a arder 500 mil hectares em Portugal daqui a 10 ou 15 anos era importante haver um plano que concebesse a plantação de espécies que estavam lá, balanceadas com espécies autóctones adaptadas ao clima e ao solo local". "O sobreiro tem de ser uma das apostas. Temos aqui muito a aportar quer em termos de sumidouro de CO2, quer em termos de resistência aos fogos", garante.

"Divulgar a cortiça como um material único, sustentável, com características de sumidouro de carbono" será uma das prioridades da empresa nos próximos anos, até por razões comerciais. "O facto de cada tonelada de cortiça produzida reter 73 toneladas de CO2 é para nós um argumento de venda absolutamente fantástico", assinala. 


PERGUNTAS A PAULA AMORIM
Presidente da Amorim Investimentos e Participações
"Salvámos a própria rolha de cortiça"

Paula Amorim, presidente da Amorim Investimentos e Participações, acredita que a importância que hoje é dada à sustentabilidade vai ajudar ao crescimento do negócio.

Quando se olha para os 150 anos do Grupo Amorim há um momento relevante há cerca de vinte anos em que a empresa estava a atravessar um momento difícil e chegou a equacionar desistir da rolha e apostar nos vedantes de plástico. Decidiram apostar na rolha e hoje são líderes mundiais. Sente que de certa forma a família Amorim salvou a rolha de cortiça? Sem dúvida. Quando houve a invasão das borrachas e das tampas de rosca foi um momento de reflexão para nós, para o grupo. Refletimos sobre o nosso futuro e como iríamos conduzir o nosso negócio daqui para a frente. O acreditar que se tem um produto nobre e um pensamento a longo prazo como a família Amorim tem, permitiu sem dúvida que nós salvássemos a própria rolha de cortiça.

Esse foi um momento definidor e delicado.
Houve de facto uma fuga muito grande de alguns clientes importantes para outras soluções. Na época também não estávamos maduros em relação à questão do TCA [a molécula que dá o gosto e cheiro à rolha] que acontecia. Havia mais argumentos da parte dos produtos alternativos em convencer alguns clientes e produtores de vinho para mudarem. Hoje esse problema é quase inexistente e queremos até ao final do ano tê-lo completamente estancado. O que só foi possível com ciência e técnicas que demoraram o seu tempo.

A questão da sustentabilidade e o caminho para a neutralidade carbónica representam uma oportunidade?
Nós estamos alinhados com o novo "trend", que veio para ficar. As alterações climáticas a isso obrigam. O mundo, em muitos setores, está a migrar para soluções mais ecológicas e nós temos um produto que está na fileira da sustentabilidade. Eu acho que só podemos olhar para o futuro com uma esperança enormíssima. 






 
 

Fonte: In, Jornal de Negócios
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