04 Dez 2018

"Cresci a estorvar no meio dos pasteleiros"

Diogo Almeida assumiu a Confeitaria Café Castelo há quase uma década, mas foi naquele local, no coração do Concelho da Feira, que cresceu entre pastéis e pasteleiros. A efeméride dos 75 anos de atividade do espaço foi celebrada com uma cerimónia que reuniu perto de uma centena de convidados.

A Confeitaria Café Castelo, uma das casas de comércio de pastelaria mais antigas e reputadas do Concelho, celebrou 75 anos de atividade. O proprietário há quase uma década, Diogo Almeida, passou a infância entre pasteleiros e cedo ganhou paixão por uma atividade que nunca mais largou.

Inicialmente, o espaço, localizado na Rua Direita e denominado Araújo & Filhos, surgiu por força governamental. "Na época, o Governo, por opção, quis separar a venda da confeção. Então, abriram o espaço", contextualiza Diogo Almeida, recordando as palavras deste semanário à data. "Uma casa fina, como diz a edição de 4 de janeiro de 1943 do CORREIO DA FEIRA. A firma era composta pelo pai e seus filhos. Quando o pai da sociedade faleceu, um dos filhos, João Araújo, em termos de herança, ficou com o espaço enquanto o seu irmão ficou com outros bens". Em 1969, o pai de Diogo Almeida adquiriu a Confeitaria Café Castelo a João Araújo. "Em 2009, assumi a gerência, mas já trabalhava e confecionava desde 1991". O atual proprietário tinha apenas dois anos quando começou a frequentar, por força das questões e dos laços familiares, um espaço no qual passou toda a infância. "Cresci a estorvar no meio dos pasteleiros", recorda.

Não foi fácil manter a Confeitaria Café Castelo aberta e em funcionamento ao público. As obras realizadas no centro da Feira prejudicaram, à data, o comércio. "Esta casa sentiu muito quando fecharam a rua ao trânsito. Realizaram- se obras de fundo, a rua esteve fechada à passagem de trânsito e de pessoas. Por exemplo, passámos de 48 unidades de cada pastel para seis. Deu-se uma queda abrupta", relembra, refutando que, atualmente, essa alteração, a proibição à passagem de automóveis no local, ainda é sentida nas contas. "Em dias de chuva, nem vale a pena produzir tanto. Perco venda porque não existe estacionamento perto", avança, apontando a pretensão em abrir um outro espaço comercial para contornar o problema. "Estou a pensar em abrir um ponto de venda, numa outra localização, mas relativamente perto, com fluxo de trânsito, para conseguir vender o mesmo, embora com outro custo. As margens de lucro já são apertadas e vai ser ainda pior com a contratação de mais funcionários e acréscimo nas despesas de transporte. Estou a estudar a situação".

O segredo? "A qualidade"

Diogo Almeida não pestaneja, nem hesita, quando é questionado sobre o segredo em manter uma pastelaria em funcionamento durante 75 anos. "Manter a qualidade dos produtos". No entanto, a grande paixão, criar novos doces, está estagnada em virtude de apenas conseguir comercializar os produtos tradicionais. "Comecei a trabalhar e só depois tirei três cursos de pastelaria. Senti a necessidade de evoluir. Quem gosta da pastelaria, gosta da inovação, de inventar e de criar coisas novas, mas de que adianta se não existe um público-alvo? O que faz as pessoas virem à Confeitaria Castelo é a qualidade dos produtos. Estando a chover, por exemplo, não se deslocam do Rossio para virem tomar o pequeno-almoço. Como não é um local de passagem, não temos clientes que parem em segunda fila, comprem e saiam".

O facto de "apenas existir a Rua Direita",quando o espaço abriu ao público, foi benéfico, assim como a queda de um outro comércio pasteleiro existente. "Havia o Café Coimbra, mas teve alguns problemas e quando fechou começámos a vender o doce- de-chá lá fabricado''. Além deste produto, a Fogaça e os Caladinhos são os doces mais procurados durante todo o ano.

"A Fogaça é a especialidade da casa"

O doce típico e característico do Município de Santa Maria da Feira, a Fogaça, é aquele que mais prazer em fabricar dá a Diogo Almeida, embora os produtos usados sejam oscilantes. "E a especialidade da casa. Pelas características do forno, tradicional e a lenha. Já o doce-de-chá é feito pela família Coimbra e a Confeitaria Café Castelo apenas vende. Preservo muito e tento manter o padrão de qualidade. Já tivemos alguns problemas com os produtos usados.

Usamos fermento biológico que apresenta muitas oscilações. Por vezes, a Fogaça não cresce e as pessoas queixam-se. Agora não posso, devido à certificação, e ainda bem, mas caso colocasse um produto que melhorasse a massa, a Fogaça ficava maior e mais bonita. E um produto natural, funcionava de forma diferente e não é possível controlar".

A Fogaça da Feira é agora um doce certificado, algo que Diogo Almeida considera benéfico para os produtores. "E bom, embora ache que seja algo um pouco ambíguo. Quando demos início ao processo de certificação, pensava que seria mais rigoroso. Por exemplo, existem pessoas certificadas que, na minha opinião, não fazem Fogaça em condições. Nem em termos de aspeto, nem de paladar. Deveria haver um maior rigor tanto de produtores como de certificadores. Vou a algumas casas, cujos nomes não quero focar, e a Fogaça não tem as medidas certas. Algo não está correto. Pensei que tudo fosse mais fiscalizado, mas é consoante a produção. Um produtor pode ser visitado apenas uma ou duas vezes por ano. E o resto do ano? Pensava que seria o Agrupamento de Produtores, ao receber uma reclamação, iria controlar as fiscalizações. Até poderia fazê-lo, mas pareceria uma perseguição. E complicado. Nas grandes superfícies, a Fogaça é o que é e está certificada. Não tem aspeto, nem é, no fundo, Fogaça da Feira. Algo não está bem", frisa.

Segundo Diogo Almeida, Santa Maria da Feira e a Fogaça potenciaram-se em Portugal quando Fernando Pessa "noticiou a feitura do doce na televisão, quando só existia a RTP, o que provocou um impacto muito grande. Nos dias seguintes à reportagem, vendia-se muito mais. Havia mais procura e, tanto para a Confeitaria Castelo como para os feirenses, foi uma grande ajuda''. Contextualizando, o jornalista deslocou-se ao Concelho da Feira para realizar um trabalho sobre a Festa das Fogaceiras, tendo comprado uma Fogaça na cidade, confecionada por produtores de regueifa doce. "Não está em causa a qualidade do produto, mas sim o aspeto. Então, o meu pai enviou uma Fogaça ao Fernando Pessa dizendo-lhe como era uma verdadeira Fogaça. Este quis conhecer mais e fez nova reportagem".

Atualmente, a Confeitaria Café Castelo conta com duas pessoas a tempo-inteiro e outra a meio- termo, "o normal", mas ao fim-de- semana, há volume de trabalho para mais dois colaboradores na confeção e fabrico.'' Quando chega a altura da Viagem Medieval ou da Festa das Fogaceiras, a família ajuda. Já chegámos a ser 22 pessoas, no total, a trabalhar". Na festa comemorativa da efeméride dos 75 anos do espaço, o proprietário convidou perto de uma centena de pessoas entre amigos, antigos e atuais colaboradores, força política e autarcas.

Fonte: In, Correio da Feira
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