03 Jun 2016

Cerveja artesanal beata quer marcar a região

A produção de cerveja artesanal começa a tornar-se comum no nosso país. Hugo Lopes, natural de Paços de Brandão mas com raízes lamacenses, e Sérgio Sousa, de Gondomar, seguiram esta linha e são os responsáveis pela produção de uma nova cerveja artesanal.

Engenheiros electrotécnicos e amigos de faculdade, desde cedo tinham a ideia de criar uma empresa, só não esperavam que fosse deste cariz. "A cerveja sempre acompanhou o nosso percurso académico", brinca Hugo Lopes. Chegaram à conclusão que a cerveja e a sua qualidade vai além daquilo que se conhece por cá e o que começou como um passatempo, depois do feedback que foram obtendo e da qualidade da cerveja produzida, chegou a um outro patamar. A formação contínua que vão fazendo em workshops ajuda esta dupla de engenheiros a apurar os seus sentidos gustativos.

Sérgio Sousa recorda que começou a produzir cerveja no final de 2012 "por carolice". "Falei com o Hugo, ele mostrou-se interessado e começamos a produzir a Beata já nos finais de 2014, início de 2015", conta. Hugo Lopes revela que o espaço cedido pelo avô "ajudou a avançar com o projecto" cujos objectivos estão perfeitamente traçados. "O gozo que temos é ver as pessoas a beber e gostar do nosso produto. Queremos que seja de excelência, que marque e que identifique Santa Maria da Feira", refere.

São já três os estilos diferentes que a Beata tem. A Stout, a Indian Pale Ale (IPA) e a American Pale Ale (APA). A Beata Stout é uma cerveja preta cuja intenção é destacar um sabor mais arrojado a torrado e café. Já a IPA tem um estilo mais inglês, com mais lúpulo (ingrediente que destaca o amargor da bebida). É, segundo Hugo Lopes, "uma cerveja mais intensa e até mais picante". Por sua vez, a APA é quase como uma cópia da IPA, "mais leve, mais fresca e mais clara". Apesar desta variada escolha, os dois produtores estão já a preparar uma nova Beata. A Blonde Ale. "É uma cerveja belga, já fizemos um lote há relativamente pouco tempo. Estamos a testar, vamos esperar pelo resultado final até porque existem receitas que demoram anos a ficar concluídas", projecta Hugo Lopes.

A importância de beber cerveja... para a produzir
Quem o diz é Sérgio Sousa, que sente já faculdades no paladar que anteriormente não sentia. "Beber cerveja é uma parte muito importante da aprendizagem. Beber cerveja de outros produtores e procurar estilos. Por exemplo, neste momento, já conseguimos distinguir o malte na cerveja ejá conseguimos ir a pormenores que há um ano e meio atrás não conseguíamos", inicia.

Para Sérgio Sousa, "produzir cerveja é a mesma coisa que cozinhar". "Toda a gente consegue fazer uma carne estufada, só que a carne estufada da nossa avó tem aquele toque que só ela sabe fazer. Mas ela só chegou a esse pormenor ao fim de dezenas de anos a fazer esse prato. Na produção de cerveja é a mesma coisa", compara. Já Hugo Lopes afirma que "não é difícil produzir cerveja, o que é difícil é chegar ao pormenor". "Difícil é conseguir que a cerveja tenha mais corpo, mais sabor e mais álcool", diz. Ambos destacam a partilha de informação com colegas de outras marcas como factor de elevada importância no resultado e sabor final da cerveja.

Malte, açúcar, mosto, lúpulo, fermentações e cozeduras. Pode parecer complicado mas Sérgio Sousa explica como funciona todo o processo de elaboração da Beata. "Inicialmente cozinham-se os grãos do malte e extrai-se o açúcar, do qual resulta um mosto - líquido açucarado - ao qual é adicionado o lúpulo, planta que dá o amargor e aroma à cerveja. Mosto esse que posteriormente será fermentado, transformando-o assim em álcool e gás", explica, salientando ainda que"o gás da cerveja é completamente natural", não contendo qualquer químico, sendo que todo este processo, desde a extracção de açúcar dos grãos de malte até ao engarrafamento, é feito em Santa Maria da Lamas, mais especificamente na Rua do Merouço, n.° 284.

Assim, e mais uma vez a comparar a produção de cerveja à cozinha, Sérgio Sousa revela que "não é difícil fazer este processo, difícil é afiná-lo". "Merece pormenor, tempo, atenção, experiência e muitos litros de cerveja desperdiçados até chegar ao melhor resultado", explica. Sérgio Sousa e Hugo Lopes contam também com a informação e software disponível actualmente para, cada vez mais, obterem melhores resultados. "Felizmente hoje em dia existem imensos softwares disponíveis que ajudam na fabricação da receita, o que nos ajuda a obter resultados e valores aproximados do que pretendemos", adianta Sérgio Sousa, apontando ainda a persistência como chave para a qualidade da Beata. "Para obtermos valores óptimos, só fazendo, experimentando, elaborando e perdendo muitas horas a estudar os maltes, os lúpulos e as suas reacções", afirma, sem nunca esquecer a "muita ciência que existe por trás deste processo". E o que diferencia a cerveja artesanal da industrializada? A principal diferença está na pasteurização, ou seja, na destruição de microrganismos existentes na bebida. A cerveja industrializada sofre essa pasteurização, ficando completamente estabilizada, e posterior filtração, o que não acontece na cerveja artesanal, como é o caso da Beata. Assim, desde o seu engarrafamento, a cerveja industrializada, como a Super Bock ou a Sagres, não sofre qualquer maturação. Já a Beata contém os tais microrganismos, mesmo depois de engarrafada. "Toda a cerveja caseira, mesmo estando engarrafada e pronta a ser consumida, continua a sua fermentação e a ganhar álcool. Por isso é que existe sempre um resíduo no fundo das garrafas das cervejas artesanais, como é o caso da Beata", afirma Sérgio Sousa.

O empresário diz ser impossível determinar o tempo gasto no processo, apontando que "uma cerveja que se produza hoje, só daqui a um ou dois meses é que se saberá se está boa". "Não é amanhã, nem daqui a 15 dias. Além disso, nunca podemos deixar de registar os pormenores, tempos e temperaturas que usamos durante todo o processo", afirma.

Burocracias atrasam venda ao público
"A parte mais difícil", é assim que Hugo Lopes se refere à muita burocracia e legislação que tem de se atravessar para se poder comercializar a Beata. "Estamos a finalizar todo o processo de legalização desde Janeiro. Não é nada fácil, se não fosse a vontade que temos, muito provavelmente já teríamos desistido", revela Hugo Lopes. A Sousa & Lopes Craft Brewery, Lda é uma pequena indústria que está limitada por lei a produzir 2500 litros de cerveja por ano. Pode produzir a cerveja em casa, espaço cedido pelo avô de Hugo Lopes, que teve de ser licenciado para o efeito. "Deixou de ter um alvará de habitação e passou a ter um industrial", avança, adiantando ainda que actualmente falta apenas uma "mera comunicação à Câmara da Feira", para concluir todo este processo moroso. Os produtores da Beata têm ainda que pagar uma taxa fixa à Alfândega por cada litro de cerveja que vendam, apesar de não fazerem qualquer tipo de exportação.

Associar a Beata a Santa Maria da Feira
Além da muito esperada comercialização ao público, esta dupla de engenheiros electrotécnicos tem como grande objectivo que as pessoas, ao ouvirem falar da Beata, a associem directamente a Santa Maria da Feira. Ambos revelam que, dos estudos que têm feito, concluíram que os países que não são desenvolvidos em vinho, desenvolvem a sua cerveja. Em Portugal, acontece o contrário. Ao existir uma enorme cultura do vinho, a cultura cervejeira ficou um pouco estagnada. "A nossa ideia, nesta primeira fase, é que associem a Beata à nossa região. Gostávamos de começar por cá e esse será o nosso objectivo, sem nunca fechar as portas a ninguém, naturalmente", declaram.

Apesar dejá terem marcado presença em encontros e feiras de produtores de cerveja artesanal, e não só, Sérgio Sousa destaca a importância e necessidade de participarem como produtores. "Queremos participar em feiras e encontros nacionais, mas queremos estar completamente legais. Ainda há pouco tempo estivemos no Pátio da Cerveja em Lisboa. É nestes sítios que se trocam impressões. É importante participar como consumidor e será também bastante importante participar como produtor", afirma.


"Se existe um vinho casa, porque não uma cerveja?" - Hugo Lopes atira a pergunta para o ar, traçando mais um objectivo para a Beata. "É possível porque temos a vantagem de conseguir produzir quantidades específicas de cerveja. Era apenas uma questão de adequarmos o rótulo à identidade", sugere. Em tom de conclusão, revela que "o feedback daqueles quejá provaram a Beata é positivo" e que, de todas as críticas, tentam "filtrar aquilo que interessa" com o objectivo de melhorarem os seus lotes.


Fonte: In, Correio da Feira
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